Papiloscopia na Patagônia
Hoje fiquei sabendo que existe um banco de dactiloscopia na Pagônia. Sim! A impressão das nossas papilas digitais viaja até o extremo sul do continente americano. Ali, caso haja algum problema, a pessoa fica num grupo especial e só um PAPILOSCOPISTA tem acesso ao sistema para resolver o que for.
Minha última Carteira de Identidade está deteriorada e desatualizada, era casada ainda. Agora num outro estado civil, aproveitei as férias e resolvi encaminhar o novo documento. Fiz a agenda pela internet no Tudo Fácil em janeiro, consegui marcar para dez de fevereiro. Achei facílimo!
No dia e hora marcados, tirei óculos, coloquei lentes de contato, caprichei na maquiagem do tipo natural, tratei o cabelo... Cheguei cedo ao local; logo fui atendida. O atendente gentil examinou os documentos, questionou o nome, estado civil, nome outra vez e confirmou:
- Então a senhora permaneceu com o mesmo nome que usava ao ser casada?
- Sim, é isso mesmo! Resolvi não trocar outra vez, pois já havia construído um nome profissional e – expliquei.
- Confira os dados e assine aqui, por favor.
Com uma câmera digital, fez a foto, recomendando que deveria colar os lábios, estes não poderiam ficar entreabertos. Questionou se a foto estava bem. Respondi que fotos para documentos são assim. Sorriu.
Entregou-me uma guia para pagar e um protocolo para retirada da nova Carteira. Havia uma ressalva de que poderia retirar, oito dias após ter efetuado o pagamento. Paguei no ato, admirada do caixa atender até aquela hora.
Veio carnaval, feriados.
Dia vinte e cinco fui retirar. Uma mocinha fez contas e me ensinou que eu não havia contado direito, pois o dia do pagamento não seria contado. Pensei em Kafka.
Passaram-se alguns dias e retornei lá, um atendente avisou que não estava pronta. Solicitei falar com a chefia. Pediram um telefone para contato, deixei o número do celular.
Fui até a gerência do Tudo Fácil, protocolei uma reclamação por escrito, com nome, telefone e endereço eletrônico.
Antes mesmo de chegar em casa recebi um telefonema avisando que precisava levar novamente a certidão de divórcio, eu havia caído num grupo especial.
Uma semana após retornei carregando a certidão solicitada. Fui recebida por uma funcionária que se queixava não conseguir entrar no sistema. Procurou a Papiloscopista. Passando por mim a especialista do alto de seu posto perguntou:
- A senhora sabe como funciona a papiloscopia? Caso dê algum problema na dactiloscopia, que vai toda para a Patagônia, a senhora entra num grupo especial e aí é necessário ver qual é o problema.
Fiquei atônita, senti culpa de não saber o trâmite das minhas impressões digitais, e fiquei até com um pouco de ciúme delas viajarem para a Patagônia enquanto eu ficava ali preocupada com o horário de uma consulta médica. Confessei minha ignorância e avisei que tinha pressa.
Senti medo, imaginando que grupo seria esse.
A técnica passou meu documento para outra funcionária. Um telefonema me separava da solução, o telefone ainda parecia ocupado.
Liguei do celular para o consultório avisando que chegaria atrasada, pois o Tudo Fácil estava dificultando minha vida.
Tensos minutos. A primeira funcionária voltou com meu protocolo e disse:
- Agora, a senhora deve aguardar os oito dias, senhora, o prazo recomeçou.
Não acreditei! Em surto, olhei para o cartaz que sentenciava detenção e prisão para quem desacatasse funcionário público e tentei medir a distância entre reclamar um direito e desacato. Bati no peito e disse que pagava meus impostos em dia, era cidadã idônea e esperava que no mínimo o Estado fosse sério e competente comigo.
- Daqui a dois dias seu novo documento estará à disposição! – esclareceu a moça do telefone.
Saí dali com dois sentimentos se sobrepondo aos demais: impotência frente aos liames da burocracia e inveja das minhas impressões visitarem a terra dos pés grandes antes que eu realize meu antigo desejo. Kafka, outra vez!
Mulheres Trabalhadoras Saía e voltava só na madrugada fazendo barulho, me acordando, após cada explosão de raiva, cada crise de gritos, ameaças e tentativas de me trancar em algum lugar da casa ou no carro. Em muitas manhãs saí pra trabalhar com muito sono, mas aliviada de não ter que ficar junto com a pessoa. Aprendi a conviver com esses rompantes de diferentes maneiras. Às vezes ficava muda, lembrando a avó Solita, outras, acho que não me dava conta do que estava acontecendo e ainda argumentava, tentando chama-lo à razão. Em outros momentos, entrava na onda e gritava, me enfurecia também. Esta reação me deixava muito mal, pois percebia o poder que a pessoa tinha de comandar até meus sentimentos, reações. Meu coração disparava. Nos últimos tempos, durante período em que estava trabalhando menos, em Férias ou Licenças, comecei a sentir mais nojo, até o fato de sentar à mesa junto me incomodava. Preparava o alimento com cuidado, procurando não passar energia ruim pras panelas e sen...
NÃO LI OS PRIMEIROS TEXTOS SEUS, POIS COMEÇEI PELO MAIS RECENTE POR UMA QUESTÃO DE CURIOSIDADE SOBRE O TÍTULO, MAS ACHO QUE FIZ A ESCOLHA CERTA, POIS ESSE É UM DOS TEXTOS MAIS BEM ESCRITO QUE JA LI NOS BLOGS DA VIDA...ENTÃO AGORA VOU LER OS MAIS ANTIGOS E SE TIVER ALGUM TÃO BOM OU MELHOR QUANTO ESSE, EU ESTAREI NO LUCRO...PARABENS
ResponderExcluirABRAÇO
Pôxa... Patagônia! Eles podiam mandar a gente direto para lá, colher impressões digitais... quem sabe o tal "grupo" não é interessante? Ah e mais uma coisa, os 8 dias viram 2 quando a pessoa se sente ultrajada? Que coisa, hein? Gostei muito. Beijooo
ResponderExcluirPois é, infelizmente o serviço público é assim. Inventam desculpas esfarrapadas para, em óbvio corporativismo, acobertar a negligência de algum outro funcionário.
ResponderExcluirNossas impressões digitais, quando coletadas, seguem para processamento e pesquisa na base de dados, que fica ali na Avenida Azenha, 255.
Como o sistema AFIS (Automated Fingerprint Identification System) utilizado é uma personalização da ferramenta da empresa NEC-Japan, a qual já fora personalizada pela NEC-Argentina, algumas mensagens do sistema vêm em espanhol. Daí o folclore "Patagônia". Como funcionário do Departamento de Identificação do Estado sempre lutei contra o descaso dos servidores com a urgência das pessoas. No entanto, faço parte de uma minoria.
É bem verdade que existem casos em que não devemos realizar as atividades influenciados pela pressa. Jamais realizamos uma pesquisa de Identificação Post Mortem correndo contra o tempo, pois, não queremos que um cadáver seja enterrado com um nome errado. Também não temos pressa quando da pesquisa de um minúsculo fragmento de impressão digital encontrado em um local de crime, o qual pode apontar a autoria de um delito.
Enfim, existem casos e casos. Mas, que uma carteira de identidade deve ter seu prazo de entrega cumprido, é fato!