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MULHERES TRABALHADORAS

Mulheres Trabalhadoras Saía e voltava só na madrugada fazendo barulho, me acordando, após cada explosão de raiva, cada crise de gritos, ameaças e tentativas de me trancar em algum lugar da casa ou no carro. Em muitas manhãs saí pra trabalhar com muito sono, mas aliviada de não ter que ficar junto com a pessoa. Aprendi a conviver com esses rompantes de diferentes maneiras. Às vezes ficava muda, lembrando a avó Solita, outras, acho que não me dava conta do que estava acontecendo e ainda argumentava, tentando chama-lo à razão. Em outros momentos, entrava na onda e gritava, me enfurecia também. Esta reação me deixava muito mal, pois percebia o poder que a pessoa tinha de comandar até meus sentimentos, reações. Meu coração disparava. Nos últimos tempos, durante período em que estava trabalhando menos, em Férias ou Licenças, comecei a sentir mais nojo, até o fato de sentar à mesa junto me incomodava. Preparava o alimento com cuidado, procurando não passar energia ruim pras panelas e sentava num lugar distante. Passávamos muito mais tempo da semana “brigados” do que aproveitando a vida. Mesclávamos quatro dias de mal por três dias melhores. Outra vez a pergunta “O que estou fazendo comigo?” me acompanhava. Já passei dos sessenta, idealizei tranquilidade, paz. Chegava a sentir dó quando ele aparecia sem dinheiro, com cara de cão velho e necessitado. Catava moedinhas pra comprar cigarro. Durante um tempo andava cabisbaixo, sem beber ou falar. No entanto, quando pedia desculpas, era de forma irônica, não demonstrava reconhecimento de que agira mal. Discutir a relação era perda de tempo. Tentei algumas vezes. Em algumas situações, quando tudo estava se acalmando, ele resolvia cobrar carinho, amor como se ele fosse o “sol” do meu mundo. Hoje, estou no processo de divórcio e tenho tido dificuldade em encaminhar algumas situações práticas, principalmente naquelas esferas ainda muito dominadas pelo machismo. Na oficina mecânica, convidei um colega pra ir comigo, pois o mecânico inventou troca de peças por novas quando, na verdade, estavam sendo trocadas por recondicionadas. Penso que as mulheres da classe trabalhadora têm dificuldades quase intransponíveis quando se encontram nesse tipo de relação. Assoberbadas com o trabalho, a dupla jornada e tendo que enfrentar situações de moradia, transporte. Entre o momento que tomamos consciência do que estamos vivendo e a tomada de decisão tem um hiato. Demanda tempo, dinheiro e opções da vida prática. Esse tipo de relação é feito uma doença. Estou convalescendo.

Comentários

  1. Querida Maria Isabel
    Saíste do desespero q uma doença grave causa na vida de alguém. Estás como disseste, em convalescença. Ainda há dores mas o pior já passou eu acredito. Segue forte q logo o restabelecimento será pleno e revigorante. Um beijão.

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    1. Obrigada, Marizete Costa. O apoio de vocês tem sido valioso. Beijos

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  2. Agiste muito bem...sair deste relacionamento....parabens.

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  3. Cassia Silva Gonçalves7 de outubro de 2017 às 17:04

    Que peso tuas palavras, Maria Isabel, carregadas de emoção.
    Com o mesmo peso vem tua força!
    Tudo tem seu tempo...
    de vivenciar, de encerrar uma fase e recomeçar outra.
    Parabéns pela garra e a volta por cima que está dando por mais sofrido que seja.
    Bjão.

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    1. Gracias, Cássia.
      Penso na responsabilidade social que temos com as outras mulheres. O que pra nós apresenta um grau de dificuldade, pra mulheres que tem filhos pequenos, salários escassos e instabilidade econômica é muito mais complicado.

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  4. Querida Isabel, não pensei que vividas um drama destes. Grande Guerreira sais da dor para dar suporte a outras mulheres que ainda não conseguiram romper com esta situação. Viu enviar o link para o Grupo Mulheres de Frontera. Que achas?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Graça, obrigada. Quanto mais mulheres ficarem empoderadas, melhor. Beijos

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  5. Querida Isabel, não pensei que vividas um drama destes. Grande Guerreira sais da dor para dar suporte a outras mulheres que ainda não conseguiram romper com esta situação. Viu enviar o link para o Grupo Mulheres de Frontera. Que achas?

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  6. Maria Fernanda Passos13 de outubro de 2017 às 05:48

    Oi "tia" Isabel ( espero que assim me permitas te chamar). Que barra né? Aqui em Jaguarão temos um grupo de Mulheres (Mulheres de Fronteira) que luta cotidianamente contra o machismo, a violência e as relações abusivas e sabe o que é o mais impressionante? É que a realidade da maioria das mulheres é como o teu relato. O machismo adoece os homens que adoecem (e matam) as mulheres. Quero te deixar toda minha solidariedade e minha força ( mesmo que à distância). Tenho certeza que sairás mais fortalecida disso tudo...e mais...com teu relato e coragem poderás ajudar outras mulheres que vivem situação pior ou semelhante a tua. Precisamos nos unir e entender que não estamos sozinhas nessa jornada. Somos muitas...e venceremos! Um beijo grande e um abraço bem apertado!! ( precisando de nós é só chamar!!)

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  7. M. Fernanda querida, a solidariedade nos fortalece. Beijos

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