Triste Estatística
Minha história de vida é comum a muitas pessoas. Mais relato por ter ficado do outro lado de uma estatística trágica. Gostaria que minha experiência pudesse ser inspiradora pra outras pessoas, outras mulheres.
Quando pesquiso sobre relações perversas e o feminicídio, entendo que tenho uma dívida social, que de alguma forma preciso retribuir por estar viva e gozando de saúde plena.
As manchetes de alguns informativos trazem o seguinte panorama: “Seis mulheres morrem a cada hora em todo o mundo vítimas de feminicídio por conhecidos, diz ONU - 87 mil mulheres morreram em 2017 vítimas de feminicídio. 58% delas foram assassinadas por conhecidos – seus companheiros, ex-maridos ou familiares.” (http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2018-11/seis-mulheres-sao-vitimas-de-feminicidio-cada-hora-segundo-onu)
“Cresce número de mulheres vítimas de homicídio no Brasil; dados de feminicídio são subnotificados.” Uma, em cada 100 brasileiras, recorreu à Justiça, por violência doméstica em 2017.” “Segundo estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em relação a 2016, o número apresentado foi 16% maior.”
“EM NÚMEROS: A violência contra a mulher brasileira” “Cresce o número de mulheres vítimas de homicídio no Brasil” “Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, total de casos passou de 4.245 em 2016 para 4.539 no ano passado”
Quando converso com mulheres variadas, todas tem um relato pra fazer sobre uma irmã assassinada, uma tia que tá sofrendo numa relação perversa. Graças à proteção divina, consegui sair daquele relacionamento a tempo de evitar um desfecho drástico.
Vou contar como tudo começou. Em janeiro de 2012, morava em Porto Alegre e trabalhava três turnos, minha filha foi me visitar e num domingo pela manhã caminhamos até o Parque da Redenção.
Almoçamos por ali e ficamos tomando cerveja num bar do Parque.
No trajeto, passamos por um plantão imobiliário e comentei com minha filha, que queria um namorado, porém não poderia ser fumante nem corretor de imóveis. Explico: estava com rinite alérgica a cigarros e outros agentes e o único tempo livre que tinha era aos finais de semana, corretores geralmente trabalham aos sábados e domingos.
Acho que o “universo” não entendeu que eu disse que não poderia ser isto e aquilo e quando vi um homem bonitão, de idade semelhante a minha, cantou um trecho da música de Diogo Nogueira pra mim: “Me leva! Oh!, vento,/ me leva pra ela”. Carente como tava, logo fiquei interessada.
Minha filha ficou de pé atrás desde esse primeiro momento. Não adiantou! Eu tava seduzida, enfeitiçada! Quase não desgrudamos mais. No carnaval visitamos minha mãe. Fazia declarações de amor na frente de outras pessoas, era carinhoso.
Parecia que nos conhecíamos há muito tempo.
Aos poucos, esse príncipe foi virando sapo.
Em meados de abril ele já ficava no meu apartamento. Já pegava meu dinheiro “emprestado”, deixava bilhetes (de verdade) alegando não ter arrumado a cama, não ter lavado a louça, mas que faria depois. Minhas coisas eram suas.
Em maio, fiz um bilhete que começava assim:
“Seguidas vezes tens sido agressivo comigo.
Tens gritado, na frente de qualquer pessoa. Tens me dado muitos “cortes”. "Procuro ter paciência, mas também tenho sentimentos comuns, fico com raiva. Certamente em outros momentos de minha vida, não estaria mais contigo ou com alguém que agisse assim comigo. Fico me perguntando porque ainda estamos juntos...”
Na mesma comunicação, mais adiante dizia: "precisas ver o que é isso que tens, pois não sei como lidar com isso e não consultas...”
Outro pedaço: “Quero ser tua companheira! com toda carga que acompanhar significa e não ser um utilitário pra ti e algo (alguém) inferior...”
Analiso este bilhete, e já verifico o seguinte: no começo, ainda achava estranho ser maltratada, depois foi ficando naturalizado isso. Ele já era agressivo, violento, gritava. De mulher orgulhosa, dona do meu nariz, passei a admitir ser tratada como ser inferior. Parecia ter sido enfeitiçada e ficado cega.
Ainda achava que a pessoa precisava de tratamento médico e ia levando a relação, imaginando que com o tempo tudo iria melhorar. Que eu deveria fazer mais isto ou aquilo. E fui deixando que as coisas tomassem esse rumo e que a “doença” dele me fizesse mais e mais submissa.
E começou, de forma sutil a me afastar das amigas, com conversinhas e chantagens emocionais. Isolada, fiquei mais e mais dentro da rota que ele traçava.
O desenlace da história já contei em outros episódios. O que é certo é a facilidade pra entrar nessa fria e a dificuldade pra sair.
Mulheres Trabalhadoras Saía e voltava só na madrugada fazendo barulho, me acordando, após cada explosão de raiva, cada crise de gritos, ameaças e tentativas de me trancar em algum lugar da casa ou no carro. Em muitas manhãs saí pra trabalhar com muito sono, mas aliviada de não ter que ficar junto com a pessoa. Aprendi a conviver com esses rompantes de diferentes maneiras. Às vezes ficava muda, lembrando a avó Solita, outras, acho que não me dava conta do que estava acontecendo e ainda argumentava, tentando chama-lo à razão. Em outros momentos, entrava na onda e gritava, me enfurecia também. Esta reação me deixava muito mal, pois percebia o poder que a pessoa tinha de comandar até meus sentimentos, reações. Meu coração disparava. Nos últimos tempos, durante período em que estava trabalhando menos, em Férias ou Licenças, comecei a sentir mais nojo, até o fato de sentar à mesa junto me incomodava. Preparava o alimento com cuidado, procurando não passar energia ruim pras panelas e sen...
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